Redes Sociais
Redes sociais são uma tecnologia?
Em uma conversa com Rodrigo Ratier, jornalista e orientador deste trabalho, foi dada a ideia de tratar as redes sociais como uma das tecnologias que compõem o jornalismo. Parecia estranho, já que as redes fazem parte do nosso dia a dia. Para mim, que nasci no fim do último século mas já quase neste, as redes são já uma forma de me comunicar e me comportar, tanto quanto telefones, celulares, notebooks e todos os aparelhos que sabemos ser tecnológicos, mas já estão tão inseridos em nosso dia a dia que não pensamos sobre eles.
Acontece que é esse mesmo o ponto. Rodrigo, um pouco mais velho que eu, viu surgir as redes sociais, tanto quanto as ferramentas multimídia de áudio e vídeo no jornalismo, em mundo em que elas ainda não existiam. Isadora Ortiz de Camargo, jornalista e pesquisadora de comunicação digital na USP, explica que foi a partir de 2010 que as redes ganharam força no Brasil, com o aumento dos dispositivos móveis por aqui. Hoje — e para fins de interpretação nessas reportagens — elas “fazem parte de nosso comportamento, assim como a prática multimídia do áudio e vídeo, muito além de serem uma tecnologia”, diz Isadora.
Mas e no jornalismo, onde é que entram as redes sociais? Assim como a internet provocou mudanças na profissão, as redes fizeram o mesmo, de forma a intensificar o processo. A distribuição, que antes ficava no controle dos publishers, segundo escreve Bradshaw, passa a ficar em partes à mercê de plataformas de distribuição de conteúdo:, as redes sociais — Facebook, Instagram e Youtube, por exemplo — e o Google. O movimento, inclusive, faz parte de um fenômeno maior, descrito por Roseli Fígaro e Ana Flávia Marques em “A comunicação como trabalho no capitalismo de plataforma: o caso das mudanças no jornalismo”. É um movimento em que produtos (no caso do jornalismo, o conteúdo) antes vendidos pelos seus proprietários passam a ter um intermediário (nesse caso, as redes sociais e o Google), que fica com parte dos ganhos para si, como acontece com AirBnB e Uber.
Estratégia de produto para o jornalismo nas redes
Jéssika Nakamura é jornalista e editora de redes sociais no UOL. Ela conta que, quando começou, já tinha o hábito de usar as redes, mas não sabia da possibilidade de atuação profissional. “Fui uma criança que viveu o boom da internet. Quando a internet começou no Brasil, eu estava ali no bate-papo do UOL, no Fotolog, então era uma coisa que já vinha de mim, mas que eu não sabia que tinha o lado da profissão”, diz. Atualmente, ela trabalha com distribuição de conteúdo hard news nas redes sociais.
Ela explica que existem algumas formas de pensar a distribuição de conteúdo. No UOL, existem duas equipes: a equipe de aquisição, que busca trazer o público para o site, e a de engajamento, que tem a intenção de prender a atenção do leitor na própria rede. Ela faz parte da equipe de engajamento: “a minha equipe é muito mais voltada para, não só conseguir explicar a notícia, educar o leitor, o público, mas para gerar essa presença de marca”. Em sua visão, uma das funções da equipe de engajamento é aumentar o awareness da marca — ou seja, o conhecimento do site pelo público, para que acesse e use o portal.
Publicação no Instagram do UOL, no estilo hard news, como as que Jessika cuida como editora
Aqui cabe uma observação: o modelo de negócios do UOL é a publicidade no site, ou seja, o portal ganha dinheiro com acessos a seu conteúdo. Quanto mais usuários acessarem o site, mais pessoas verão a publicidade. Assim, o mercado paga mais pelos anúncios, e o portal ganha mais. Por isso, é interessante para o UOL trazer pessoas das redes para o site, para que possa ganhar dinheiro com isso. Além desse modelo, existe também o de assinaturas, em que o objetivo é fazer com que o leitor pague pelo conteúdo que acessa, sendo essa a forma de o veículo se sustentar financeiramente. Nesse caso, o objetivo é não só levar o usuário para o site, mas também fazer com que ele pague após o consumo de algumas matérias (no modelo de assinaturas poroso), ou já no primeiro acesso (no modelo de assinaturas exclusivo). Todos esses acessos, incluive, podem ser medidos por meio de métricas.
A tecnologia nas redes
Para distribuir o conteúdo nas redes, entram em ação os algorítmos de cada uma delas. Isadora explica o que são eles: “um mecanismo da inteligência artificial e da engenharia de busca das redes”. São um recurso tecnológico usado pelas plataformas para distribuir o conteúdo. “Esse algoritmo, que a gente não sabe quem é, que rosto ele tem, quais são as características, é um indicativo hoje de monopólio das cinco maiores empresas de tecnologia do mundo: Google, Facebook, Amazon, Microsoft e Apple”. São elas que monopolizam o conhecimento algorítmico e tecnológico, o que indica que os jornalistas não têm total controle da forma como aquilo será distribuído, apenas noções. No caso do Google, a plataforma disponibiliza algumas informações sobre as mudanças no algorítmo mas, ainda assim, a transparência não é grande. Jéssika Nakamura explica que de fato não há transparência no funcionamento dos algorítmos, apesar de ser possível ter uma noção de como funcionam. “É uma coisa que a gente faz essa lista do que funciona, mas aí daqui a uma semana eles vão lá e mudam o algoritmo. Aí a gente vai lá e muda de novo”. É por meio de tentativa e erro que se constrói a estratégia para as redes.
Ainda assim, ela enxerga a importância de que o jornalista esteja presente nesse ambiente. “É essencial enxergar a importância das discussões dentro das redes sociais, de entender que é um termômetro para o que está sendo discutido dentro da sociedade, porque as redes sociais são um reflexo da sociedade. E também para o repórter, pode ser útil para encontrar fontes”. Por isso, apesar das dificuldades impostas pelo meio, é essencial estar nele, como mais um dos espaços a serem ocupados pelo jornalismo. Estar ali é parte da prática multimídia, além de incorporar conhecimentos de tecnologia e produto, características do jornalista MTP, perfil de profissional estudado por aqui.