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Ecossistema de Mídia

Relações entre as áreas de atuação do jornalista MTP

As áreas em que o jornalista MTP, nome dado por aqui ao perfil de profissional que não só trabalha com tecnologia, mas também com prática multimídia e produto, atua foram mapeadas com base em conversas com as fontes e em leituras. São elas: multimídia e redes sociais — como prática já incorporada ao comportamento do profissional — e SEO técnico, experiência do usuário, jornalismo de dados, checagem de fatos e métricas — como áreas com forte presença de tecnologia.

 

Conforme a apuração se desenrolou, ficou claro que além das conexões observadas entre os profissionais, que se conheciam entre si por desempenharem funções semelhantes, há outras estabelecidas também entre as áreas, de modo a formar um ecossistema. Isadora Ortiz de Camargo, jornalista e pesquisadora de conteúdo e comunicação digital na USP, ressalta a importância de compreender essas conexões. “Eu acho que a análise do sistema de mídia, inclusive biológica, é fundamental. Eu estou em linha com a visão de que é um ecossistema que se retroalimenta”, diz. 

Algumas das relações estabelecidas são mais claras e outras mais sutis. Algumas das mais claras: as redes sociais são plataformas em que se pode distribuir todo tipo de conteúdo produzido — jornalismo de dados, checagem de fatos e áudio e vídeo (aqui chamado de multimídia). O desempenho tanto de publicações quanto de páginas de sites pode ser medido por meio de métricas. A experiência do usuário é levada em consideração na hora de pensar na estrutura de qualquer site. O SEO técnico é usado para otimizar a distribuição de qualquer conteúdo no Google. Você pode conferir todas as conexões no mapa:

ecossistema de midias no br.png

Mas durante as entrevistas, outras relações mais complexas começaram a se mostrar também. A Meta (dona de Facebook, Instagram e Whatsapp) e a Google, mesmas plataformas que romperam com a forma de distribuição tradicional do jornalismo — são patrocinadoras de iniciativas de checagem de fatos e jornalismo de dados. E há também coalizões entre diferentes veículos, criadas para impulsionar sua capacidade de produção, credibilidade e alcance. “Dentro desse ecossistema, existem aceleradoras e laboratórios de notícias. E mais recentemente a gente tem visto essas estruturas de consórcio de jornalismo, que utilizam das tecnologias para se juntar”, diz Isadora. Olhar para todas essas intersecções é fundamental para compreender o ecossistema em que está o jornalista MTP.

 

 

Ecossistema de mídia com base em experiências no Brasil

 

Ao investigar iniciativas de jornalismo para essa série de reportagens, chamou atenção o patrocínio de Google e Meta a algumas delas. O Comprova, projeto de checagem de fatos abordado na reportagem sobre checagem de fatos, recebe apoio do Google News Initiative e Facebook’s Journalism Project. A Fátima, robô checadora da Aos Fatos, é apoiada pelo WhatsApp. Outro exemplo é o debate para presidenciáveis ocorrido em 2022, com parceria entre UOL, Folha de São Paulo, Band e TV Cultura, que recebeu apoio da Google News Initiative, em parceria com YouTube (também da Google).

Google Trends é usado em debate dos presidenciáveis nas eleições de 2022, mostrando as buscas por termos no Google

“Quando o Google cria um Newslab — como o Google News Initiative, ele vai acelerar iniciativas do jornalismo, para fazer essa ponte com a estrutura tradicional da imprensa”, explica Isadora. O mesmo raciocínio se aplica ao Facebook’s Journalism Project e ao apoio do Whatsapp, da Meta. Mas quais os ganhos para as Big Techs em criar esse tipo de projeto?

Há mais de uma resposta para essa pergunta. Segundo José Antonio Lima, editor do Comprova, não seria possível financiar o projeto sem apoio da Meta. Na visão dele, a participação das plataformas na iniciativa acontece como uma forma de se responsabilizar pelo conteúdo que circula ali. “Acho que é uma questão de responsabilidade social. É um reconhecimento de que uma parte do que circula ali é em larga medida deletério para a sociedade e para a democracia, então algo precisa ser feito”, diz.

Mas Isadora traz também outro ponto importante. As Big Techs lucram por meio da venda de dados de seus usuários para empresas que desejam vender produtos. Com o uso desses dados, é possível que a propaganda — como a que vemos no Instagram, YouTube e Facebook — seja direcionada de forma mais assertiva, com base em interesses, e isso tem muito valor. Ao promover esse tipo de iniciativa, as Big Techs garantem que o conteúdo produzido pelas empresas jornalísticas continue circulando dentro delas, e que os usuários permaneçam ali.

Como exemplo disso, ela usa o apoio da Google ao debate dos presidenciáveis. “É uma parceria incrível, porque você tem uma equipe técnica do Google mostrando os trending topics para as pesquisas em tempo real, coisa que uma redação de jornalismo não conseguiria fazer. Você tem ali uma tecnologia Google, em uma permuta. E no caso do Google, ele ganha visibilidade”, diz. Com isso, a Google atrai também usuários para si, que se sentem interessados em pesquisar pelos termos, e ganha ao comercializar os dados gerados por eles. Apesar desse ganho, é importante ressaltar que não há interferência na linha editorial dos veículos por parte das plataformas, como afirma José.

Outro fator de destaque desse ecossistema é a presença de coalizões de veículos. O próprio Comprova é uma delas. Além dele, há a coalizão de veículos criada para o debate dos presidenciáveis que falamos ali em cima, e a que surgiu durante a pandemia, para extrair dados sobre o coronavírus por meio de uma parceria entre veículos. José Antonio Lima fala das vantagens desse tipo de iniciativa. “A gente tem pessoas de veículos concorrentes que trabalham lado a lado para criar conteúdos o mais rápido possível. A ideia é de um serviço de utilidade pública. Que o conteúdo seja o mais crível possível, com maior grau de credibilidade, publicado o mais rápido possível”, diz.

São iniciativas, tanto as que envolvem as Big Techs quanto as coalizões, que colocam o ecossistema de mídia em colaboração. “Existem essas iniciativas que orbitam dentro desse ecossistema e eu diria que renovam e dão vida para ele. São iniciativas que vem ou das empresas de tecnologia ou dos próprios jornalistas que, cansados da velha e tradicional imprensa, se organizam para fazer coisas diferentes, sem a amarra do financiamento midiático”, diz Isadora. E é nesse ambiente que atua o jornalista MTP.

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